sexta-feira, 22 de junho de 2007

Camões em Traço Comum

O pôr do sol de hoje foi contemplado, por mim e um vasto grupo de amigos, na mágica vila de Sintra, local onde se realizou a nona e última sessão (apenas deste 1º ciclo de vida, espera-se) de poesia, nesta viagem do Traço Comum (Tertúlia de Poetas de Sintra) por todo o concelho Sintrense.

Nove meses percorrendo cafés com história, divulgando a poesia, a língua e a cultura portuguesas, integrando os poetas locais e as letras de cada uma das terras visitadas:

Queluz, Agualva-Cacém, Montelavar, Rio de Mouro, Mem Martins, Gouveia, Fontanelas, Pêro Pinheiro, Colares e Sintra.

A sessão desta noite foi o culminar de uma jornada riquíssima em locais e gentes, retalhos da alma humana que celebrou o seu expoente máximo em redor de algo que é para muitos indefinível, para mim será provavelmente a Arte da Alma: Poesia.
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Nesta noite de 21 de Junho de 2007, a apresentação e lançamento da Antologia do Traço Comum demonstra o esforço que cada um de nós pode e deve fazer na defesa da arte e da cultura.
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Recordo os poetas tema e poetas locais de cada sessão:

Queluz - Ruy Belo / Fernando Lobo

Agualva-Cacém - Alexandre O'Neill / Pinto de Carvalho

Montelavar - António Aleixo / Josué António Capucho

Rio de Mouro - Gomes Ferreira / José Afonso

Algueirão / Mem Martins - Raul de Carvalho / José Baião

Fontanelas / Gouveia - David Mourão-Ferreira / José Valentim

Pêro Pinheiro - Florbela Espanca / Abel Alentejano-Beirão e Caetano Elias

Colares - Fernando Pessoa / José Fernando Badajós

Sintra - Luís Vaz de Camões / Carlos de Melo

Para os apreciadores de Eça de Queiroz, e em particular da sua sobejamente conhecida obra "Os Maias", o jantar desta sessão de poesia revestiu-se de um sabor a fantasia, requinte e ficção.

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O palco de toda a acção foi o Sintra Central Hotel (antigo Hotel Central), homónimo do Hotel Central (Cais do Sodré), elemento crucial na obra de Eça. De facto, em toda a narrativa de "Os Maias", a refeição com maior relevo parece ser o jantar no Hotel Central, com a sua polivalência de fins, entre as quais, a de contribuir para o desenvolvimento da teia amorosa.
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É no momento em que entram no Hotel que Carlos e Craft se deparam com a, então ainda desconhecida, Maria Eduarda, que passa por ambos antes destes jantarem. Mais tarde este "encontro" fugaz será sentido como um presságio vagueando pelas lembranças e fantasias de Carlos antes de adormecer nessa mesma noite.

"Uma mulher passava, com um casaco de veludo branco de Gênova, mais alta que uma criatura humana, caminhando sobre nuvens..."

Os presentes renderam-se à requalificação daquela unidade hoteleira, com as suas sumptuosas salas e salões, paredes e iluminação requintadas, o retrato e a musicalidade inspiradoras do piano que lá se encontra com o respectivo exímio executante, conferindo um ambiente ameno e adocicado à, já aromática, vila das queijadas.
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O Poeta tema foi, com toda a naturalidade...
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Luís Vaz de Camões

A sua dimensão é grandiosa, a sua poesia é mundial.

Por ser um símbolo da alma e identidade nacionais, a consciência de um povo, de um país, de um Portugal de outrora, de agora, d'aquém e d'além-mar, de sempre.

Busque Amor novas artes, novo engenho,
para matar-me, e novas esquivanças;
que não pode tirar-me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes, nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê.

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Quem quiser ver d'Amor uma excelência
onde sua fineza mais se apura,
atente onde me põe minha ventura,
por ter de minha fé experiência.

Onde lembranças mata a longa ausência,
em temeroso mar, em guerra dura,
ali a saudade está segura,
quando mor risco corre a paciência.

Mas ponha me Fortuna e o duro Fado
em nojo, morte, dano e perdição,
ou em sublime e próspera ventura;

Ponha me, enfim, em baixo ou alto estado;
que até na dura morte me acharão
na língua o nome, n'alma a vista pura.

Luís Vaz de Camões

5 comentários:

Anónimo disse...

O Bairro Alto é uma amálgama de culturas, de sons de cheiros, de música, de tudo e no fim da noite fica a coisa NENHUMA. O que nos resta são estes momentos guardados algures nos recônditos do nosso cérebro. E deste-me também um momento ao colocar o vídeo dos 7ª legião... Quem é que não ouve, por vezes, uma voz do fundo que chama por si... Quantas vezes procuramos quem não esquecemos... Obrigado por este momento e... Keep on going

funk disse...

Parabéns pela belíssima organização do Traço Comum. Camões é, de facto, não um grande poeta português, mas um dos maiores escritores da humanidade - como aí foi dito.

Anónimo disse...

Traço Comum 4EVA LOL... jokas

Teresa disse...

Gostava de ter estado presente.

Como querosiana apaixonada, desculpará, mas tenho de corrigir o que escreveu: o Hotel Central de que se fala nos Maias, e onde Carlos da Maia avista Maria Eduarda pela primeira vez, era em Lisboa. Em Sintra, onde Carlos da Maia vai acompanhado do Cruges, tentando encontrá-la, os hotéis referidos são a Lawrence (que ainda existe) e o Vítor.

Peço desculpa por palavras menos simpáticas que me possa ter saído, no auge da irritação, na Tasca do Sr. João. Como decerto compreendeu,nada tinham que ver consigo, apenas com aquela espécie de Savonarola que por lá apareceu.

Acropolis disse...

Tem toda a razão, de facto o ambiente foi tão inebriante que o meu subconsciente deve ter desejado que tivesse sido ali, naquele Hotel Central, em Sintra, frente ao Palácio da Vila. (risos)

Obrigado pela correcção, Teresa, o sonho é importante mas a verdade é ainda mais. ;)